sábado, setembro 10, 2005

O mundo é uma Matrix

Esta é a tradução de uma entrevista que o jornalista do site Bio-IT de informação sobre tecnologia aplicada a biologia teve em maio de 2003 com uma das maiores cabeças do nosso século , que desenvolveu o programa Mathematica que é usado no mundo inteiro em diversas aplicações científicas, e que em 2002 lançou o livro "A New Kind of Science" (Um novo tipo de Ciência), no qual tenta explicar o mundo em termos de pequenos programas de computador. O texto e as idéias em nenhuma parte são de minha autoria, só me reservei ao direito de traduzir como exercício e devido ao fato do assunto ser de interesse pessoal.

O livro "A New Kind of Science" está à disposição nesse link para consulta online (existe outra versão só texto do livro no site).

Tradução:
Via
http://www.bio-itworld.com/archive/050903/horizons_wolfram.html
Stephen Wolfram é talvez um exemplo desapontador -- ou talvez desapontado -- de prodígio da ciência ou talvez o novo Isaac Newton. Não está bem claro qual dos dois ele é.

Seu livro mais recente, publicado por ele mesmo e presunçosamente chamado "Um novo tipo de Ciência" (A new kind of Science), é um pesado livro de 1200 páginas (cuidado com a sua estante) e que pretende revelar um melhor modelo de Universo (e de tudo que nele está contido). O método é baseado em se utilizar programas de computador curtos e simples, que ele denomina "primitivas" para descrever qualquer fenômeno. Identificando as primitivas corretas e ativando-as (Wolfram diz que existem cerca de um trilhão dessas primitivas), poderemos ver o Universo se descortinando em nossa frente. De fato, ele argumenta, não existe melhor maneira de criar uma representação verdadeira de muitos fenômenos.

Para confirmar a sua assertiva, Wolfram encheu cada uma das páginas do seu livro com padrões gerados por computador. Muitos deles são muito belos e espantosamente similares a sistemas vivos; outros se parecem com simples e monótonas variações de um jogo de xadrez gigantesco. A partir dessas figuras, e a pequena lista de regras simples usadas para fazê-las, ele faz uma dedução mais generalizada da natureza.

A maior parte das suas idéias são tiradas de uma ramificação da ciência da computação chamada cellular automaton, na qual Wolfram é reconhecidamente um pioneiro. No cerne da sua teoria existem dois conceitos:
  • Equivalência Computacional: a idéia de que todos os fenômenos físicos correspondem programas de computadores simples que são capazes de produzir uma grande complexidade.
  • Irredutibilidade Computacional: a idéia de que alguns sistemas são inerentemente imprevisíveis. Rode os programas e espere para ver o que irá acontecer. Não se permite nenhum atalhos de cálculo diferencial!
Isto é um pouco demais para alguns cientistas engolirem. "Poderia-se rodar esses autômatos durante trilhões ou até mesmo trilhões de trilhões de iterações, e a imagem permaneceria no mesmo nível limitado de complexidade. Eles não evoluiriam em, por exemplo, insetos, ou humanos, ou prelúdios de Chopin," escreve Ray Kurzweil em uma crítica fascinante e em sua maior parte favorável ao livro de Wolfram (Link para a crítica de Ray Kurzweil).

De qualquer maneira, Wolfram exibe um excelente histórico. Publicou seu primeiro ensaio sobre física das partículas com a idade de 17 anos, passou com méritos pelo Eton College e pela Universidade de Oxford, e recebeu seu título de Ph. D. em Física em Caltech com 21 anos, ganhou o título de professor emérito do MacArthur com 22 anos, e passou um tempo no Instituto de Estudos Avançados na Universidade de Princeton. Mais tarde ele fundaria a Wolfram Research em 1986 e ficaria rico por escrever e comercializar o Mathematica, um software científico muito popular hoje em dia.

Durante muitos dos últimos 10 anos, Wolfram gastou noites inteiras enclausurado no segundo andar da sua casa, escrevendo Um Novo Tipo de Ciência. Manuseando o livro nervosamente, ele diz, "Tudo o que sei está aqui." O livro já está nas prateleiras há quase um ano, e obteve decididamente críticas conflitantes.

Ele ganha poucos pontos por sua maneira de agir deseducadamente. Os cabelos rareados e despenteados e com uma conversa em que sempre coloca na frente a sua pessoa e o seu trabalho. Wolfram está convencido de que descobriu uma grande idéia que mudará o mundo. John Russel, Editor Executivo da Bio-IT, em uma entrevista com ele na Conferência de Tecnologia em Bioinformática da O'Reilly (editora de livros de informática).

Pergunta:Porquê o senhor mesmo publicou o livro? Porquê não apresentou as suas idéias num jornal da comunidade, onde elas poderiam ser avaliadas por outros cientistas?
Resposta:Bom, uma ida ao Amazon.com e seriam vistos diversos comentários sobre o livro. A maior parte deles são baboseira. Isto é uma coisa muito relevante para ser propagada pelos mecanismos padrões da ciência. Como uma pessoa que há 17 anos publica um jornal (Complex Systems), eu sei como isso funciona. Basicamente, é um bom sistema para disseminar um progresso adicional dentro do mundo científico. É algo quase digno de riso e absurdo se você tentar fazer algo tão grande como o que estou tentando fazer.

Pergunta:O que você está tentando fazer?
Resposta:Eu tenho tido a experiência na minha vida de tentar alguns conjuntos de idéias e ver como implantá-las em algumas maneiras diferentes. Uma delas foi no começo da teoria da complexidade, onde eu desenvolvi uma coisa intelectual, e defini a missão, e então disse, "OK, mundo, faça isso acontecer." E não funcionou tão bem assim.

O segundo ato foi o que eu fiz com o Mathematica. Eu basicamente disse que há uma porção de idéias um tanto sofistidadas, vamos empacotá-las em um produto e fazer uma empresa para propagá-lo ao mundo. Isso parece ter funcionado muito bem. Dois milhões de pessoas no mundo usam o "Mathematica".

"Um novo tipo de ciência" representa uma mudança de paradigma. Estamos nos referindo ao campo agora com o acrônimo NKS(New Kind of Science). Eu pensei muito sobre como chamá-lo -- infelizmente, todas as lindas palavras gregas foram tomadas para denominar outras coisas. É um conjunto de conceitos que não são muito familiares, então não se pode dizer : "Puxa, a palavra aproximada é aquela."

Pergunta:Como a NKS deve ser aplicada para resolver problemas biológicos?
Resposta:A coisa básica é, sabemos como os genomas se parecem. Agora a questão é, "Como vamos a partir disso chegar ao que os organismos realmente fazem?" E essa questão é realmente, "Qual metodologia poderíamos imaginar para fazer isso?" Muitas teorias científicas se basearam na idéia de se fazerem equações matemáticas que descrevem a questão.Mas não se tem realmente uma base formada sobre a qual podemos fazer teorias sobre como um organismo deveria se parecer.

A coisa principal é encontrar primitivas para se usar com a finalidade de descrever sistemas biológicos. Quer dizer, se unirmos algumas dessas primitivas e pudermos descobrir o que acontecerá... entramos no mundo da computação para vermos o que realmente há. É parecido com o que os naturalistas fizeram há 150 anos atrás quando sairam para explorar o mundo biológico de partes obscuras da África e de outras partes do mundo, e encontraram todo tipo de espécies estranhas.

Pergunta:Quem está a procura dessas primitivas, e quanto tempo isso levará até que vejamos ferramentas que são baseadas nelas.
Resposta:Em não muito tempo. Existem pessoas nesse mesmo instante trabalhando nelas. Podemos procurar no espaço por todo tipo de programas simples, porque não existem muitos deles. Devem existir provavelmente um trilhão deles. Não deve ser difícil encontrar um espaço de um trilhão de programas simples. Enquanto que no modelo matemático tradicional existe um número infinito, e isso é muito mais difícil de encontrar.

Deverão haver diversos casos na Biologia onde existe um monte de dados que são conhecidos e que pareçam muito complicados, mas fazendo os tipos de procura apropriados ou algo parecido, alguém descobrirá que existe um programa extremamente simples que descreva o que está acontecendo.

Pergunta:O Senhor disse que a idéia convencional da seleção natural está errada. O que o Senhor quer dizer com isso?
Resposta:Costuma-se pensar que não pode haver uma teoria previsiva na biologia, porque se diz, "Bem, tudo está governado pela seleção natural e pela adaptação. Sabe, somos assim porque algum acidente aconteceu a algum trilobita há 200 milhões de anos atrás."

Mas eu não penso dessa maneira. Eu acho que na verdade há uma grande evidência de que em muitos tipos de características, o que está se vendo é tudo das escolhas possíveis e aleatórias que poderiam ser feitas. Então, por exemplo, no caso da forma dos cascos dos moluscos, o que se vê é que são todas as regras da cellular automata possíveis sendo jogadas em cada uma dessas espécies. Então, isso significa que podemos começar a ter uma teoria preditiva da biologia porque dizemos que dado que o que sabemos está alí no mundo da computação, isso mapeia dentro do que então veremos na biologia.

Pergunta:Em termos práticos, os pesquisadores querem ferramentas que eles possam usar de verdade, e não querem perder tempo procurando no espaço computacional. Onde eles irão encontrar as primitivas corretas?
Resposta:Um projeto que não é especificadamente sobre biologia computacional e que estamos fazendo é construir um Atlas de programas simples e o que eles fazem. A minha idéia é parecida com o banco de dados de química que foi desenvolvido ao decorrer de muitos anos, e neles, temos esse ou aquele composto químico, e explicando o que ele faz e onde ele pode ser útil e assim por diante. Para esses programas simples, podemos perguntar os mesmos tipos de questões usando o Atlas.

Temos tido consideráveis avanços com sites de informação pública. O MathWorld é de longe o site de matemática mais visitado do mundo. Então, uma coisa que nos deixa ambiciosos é pensar sobre coisas parecidas em outras áreas, e esse Atlas de programas simples é um exemplo. Estamos tentando formular a estratégia correta de como fazer tais coisas no contexto da biologia computacional.

Eu acho que é importante se ter uma noção sobre onde levam essas primitivas simples. Esse é o ponto principal no NKS Explorer (software que acompanha o livro) e no Atlas de programas simples, esse é o lugar onde começamos a ter uma noção de o quanto essas primitivas devem ser simples para alcançar tal solução.

Pergunta:Quando deve sair o Atlas?
Resposta:Acho que talvez no próximo mês. No momento temos uma enorme quantidade de dados que podemos colocar no repositório como as condições iniciais, por assim dizer. Mas o nosso maior interesse é que outras pessoas contribuam. O que esperamos é que muitas outras pessoas contribuam.

Pergunta:Um aspecto desconcertante da NKS é o da irredutibilidade computacional - a idéia de que não podemos prever o que vai acontecer com um programa. Pode nos dizer o que significa isso?
Resposta:Bom, vamos dizer que queremos predizer onde a Terra estará um milhão de anos no futuro. Basta colocarmos um número em uma fórmula, e imediatamente poderemos imaginar onde a Terra estará dentro de 1 milhão de anos. A questão é: Podemos fazer esse tipo de coisa num âmbito mais generalizado? O princípio da equivalência computacional diz que não, de fato, não podemos. Um sistema como esse será computacionalmente irredutível no sentido que para descobrirmos como um bit será aqui, não podemos na realidade fazer isso com mais eficiência do que apenas rodar cada passo explicitamente para ver o que ocorre.

Pergunta:A maioria dos exemplos no seu livro fala de coisas que são facilmente representadas por imagens, tais como padrões em folhas. Pode o NKS ser usado para modelar outras tarefas, tais como os ciclos bioquímicos?
Resposta: As coisas que eu estudei em grande detalhe são características morfológicas em grande escala como, por exemplo, a forma das folhas. Então quando se refere a observar pigmentações em moluscos, eu olho em um padrão e isso é muito fácil de ver que classe de programas são apropriados . Isso significa que podemos também observar redes com programas simples. Terminaremos com um padrão visual que representa alguma operação tal como fosforilação ou outro ciclo bioquímico. Estou falando de redes de reações químicas ao invés do lay-out morfológico das coisas.

Pergunta:O que o Sr. está fazendo para divulgar sobre a NKS?
Resposta:O primeiro passo é esse livro. Ao mesmo tempo, já fiz 25 palestras na maior parte das grandes Universidades dos EUA, isso já é um começo. Nesse momento já sabemos de cerca de 20 cursos sendo ministrados usando esse livro. Existem provavelmente muitos mais sobre os quais não sabemos ainda. Estamos também participando de uma conferência em Boston em Junho. Depois da conferência, estamos fazendo um curso durante o verão para estudantes de graduação da Universidade de Brown.Uma das coisas agradáveis a respeito desse enfoque com a ciência é que é possível às pessoas dos níveis mais baixos do sistema educacional chegar às fronteiras sem ter de estudar um monte de cálculo elaborado ou algo parecido. É um campo demasiado jovem no qual é possível que uma criança do colegial faça uma descoberta.

Pergunta:Existe alguma área em que essas idéias e técnicas do NKS não sejam aplicáveis?
Resposta:Quem sabe? É difícil responder esta questão até que tenhamos tentado todas elas.

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